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A gestante tem o direito de interromper a gravidez de feto anencéfalo?

Dr.José Renato Nalini


A Constituição do Brasil de 1988 enfatizou a vida como o supremo bem, pressuposto exclusivo para a fruição de qualquer direito. Tanto que todos os bens são chamados "bens da vida". Sem a vida, não há sentido se falar em liberdade, em igualdade, em propriedade e em segurança, os quatro direitos fundamentais dos quais todos os outros se irradiam.

Mas o que é a vida? Muitos tentam defini-la. Ellen Sturgis Hooper observou: "Dormi, e sonhei que a vida era Beleza. Despertei, e descobri que a vida era Dever". O primeiro dever de quem tem vida é proteger a própria vida. E a ordem jurídica, fundamento da sociedade civilizada, disso cuidou à perfeição. Além do pacto fundante, a garantir a inviolabilidade do direito à vida, o Brasil firmou o Pacto de São José da Costa Rica. Por ele, que integra a ordem constitucional vigente, por força do § 2o do artigo 5o da CF, a vida começa no momento exato da concepção.

Firmado esse tratado internacional, cessa no direito positivo brasileiro a discussão que separou natalistas e concepcionistas. A vida não começa com o nascimento, mas com a fecundação. Por isso é que ao nascituro se garantiram direitos e não meras expectativas de direito.

A partir daí, está claro que não se admite qualquer interrupção da vida, um ciclo que tem início no exato momento em que o espermatozóide fecunda o óvulo e que se encerra naturalmente, sem a intervenção humana para abreviá-lo.

O homem não é dono da vida. Não pode tirá-la em qualquer hipótese. Isto resta claro na ordem positiva, que veda a pena de morte, admitida excepcionalmente para a hipótese de guerra externa. Todo atentado contra a vida é crime, por ferir de forma a mais profunda o regramento do convívio. Homicídio, infanticídio e aborto são os delitos mais abomináveis na história da humanidade.

Diante da clareza do ordenamento brasileiro, insólito se pregue a possibilidade de interrupção da vida do anencéfalo. Compreende-se o sentimento de compaixão que deve envolver a mãe de um ser que talvez não tenha uma vida longa. Todavia, o sofrimento materno não legitima o sacrifício de uma vida.

Por mais que se argumente com a inviabilidade da vida do anencéfalo, ninguém consegue sustentar que ele não seja provido desse milagre da vida. Ao termo da gestação esta criança que talvez não tenha cérebro terá todos os membros, feições humanas, conformação que a identifica à sua espécie. Haverá quem tenha a coragem de lhe recusar o tributo à sua dignidade?

A dignidade humana é um dos princípios inspiradores da ordem constitucional vigente. O desprovido de cérebro não pertence à espécie, não é titular de dignidade?

A vida não é um tema singelo. É inerente à condição humana enfrentar adversidades, frustrações e misérias. Mesmo assim, a humanidade não pode renegar sua espécie, nem se portar com irracionalidade e tratar seus exemplares mal formados como se foram lixo hospitalar. Exatamente por ostentarem debilidades e insuficiências, tais seres merecem amor redobrado. E quem a eles dedicar afeição e respeito crescerá em humanismo, se elevará acima da fraqueza e das baixezas dos desprovidos de consciência.

Se algo existe insuscetível de graduação é a vida. Não por acaso foram vencidos os que gostariam que a Constituição Cidadã garantisse a "vida digna". Prevaleceu o direito intangível à vida. Sem qualificativos. Vida não se vincula a lapso temporal. Por breve seja e se reveste da plenitude de seus atributos. Dos quais o primeiro é a dignidade.

De qualquer forma, toda vida humana é frágil e breve. Não dura mais do que um átimo. Algo que os poetas vêm melhor do que os outros: "Temos só este momento, cintilando como uma estrela em nossas mãos... e liquefazendo-se como um floco de neve. Usêmo-lo, antes que seja muito tarde" (Marie Beynon Ray).

 

José Renato Nalini é presidente do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo (TACrim)

Fonte: Jornal do Advogado - OAB-SP - Edição de Agosto de 2004
http://www.oabsp.org.br/jornal/

 

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