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Coluna "Imprensa"

Drogas, ingenuidade e realismo

Carlos Alberto Di Franco

A população de internos da Fundação Casa de São Paulo (ex-Febem) cresceu 17% este ano, em comparação com 2008. E mudou o perfil: existem mais adolescentes de classe média cumprindo medidas socioeducativas, sobretudo por envolvimento com o tráfico de drogas. “Há jovens que vêm de uma família estruturada”, observa a presidente da instituição, Berenice Giannella. “O pai e a mãe trabalham e os filhos, muitas vezes, se envolvem com o tráfico ou com o roubo porque querem ter acesso a determindos bens, como a moto e o tênis de marca”. O último censo realizado na fundação, de 2006, já indicava que 28% dos infratores eram originários da classe média. “Não só de classe média, mas da alta também”, acrescenta o promotor Thales Cezar de Oliveira, da Promotoria da Infância e da Juventude da cidade de São Paulo.

Para Berenice, a maior presença de garotos de classe média na Fundação pode estar ligada à expansão do tráfico de drogas, que se tornou a segunda causa de internação, atrás apenas do roubo. “Costumo dizer que a droga ‘socializa’ o crime. Hoje, você tem pessoas da classe média e da classe média alta envolvidas com o tráfico – e não apenas com uso de drogas.”

Acabo de transcrever um trecho de uma excelente reportagem de Elvis Pereira, repórter do Jornal da Tarde. A matéria mostra que o envolvimento com o narcotráfico já não é uma exclusividade das periferias e dos bolsões da exclusão social. Ele bate às portas das mansões dos bairros de elite, mostra sua garra aos que se julgavam imunes ao seu apelo e ensombrece a alma de famílias que sucumbem ao drama da delinquência insuspeitada.

Segundo Leo de Oliveira, diretor da Comunidade Terapêutica Horto de Deus (www.hortodedeus.org.br), em Taquaritinga, interior de São Paulo, “crise da família, aposta na impunidade, ganho fácil e consumo garantido “explicam o novo mapa do tráfico de drogas”. Dinheiro não é garantia de estruturação familiar. Muitas vezes é exatamente o contrário. Carros, mesadas e ausência de limites compõem os ingredientes de uma bomba que explodirá lá na frente. O tráfico oferece a perspectiva do ganho fácil e do consumo assegurado. E a sensação de impunidade (rico não vai para a cadeia) completa o silogismo da juventude delinquente.

O quadro é assustador. Alguns, apoiados numa ingenuidade surpreendente, defendem a liberação das drogas consideradas leves, como a maconha, o ecstasy ou as anfetaminas.

Caso adotássemos os princípios defendidos pelos lobistas da liberação, o Brasil estaria entrando, com o costumeiro atraso, na canoa furada da experiência européia. A Holanda, que foi pioneira ao autorizar a abertura de cafés onde era permitido consumir maconha e haxixe, já está retificando essa política. O mesmo ocorre na Suíça, que também está voltando atrás na política de liberar espaços em que viciados se encontram para injetar heroína fornecida pelo próprio governo. Um amigo jornalista, irônico e inteligente, deixou cair a pergunta que paira na cabeça de muita gente: será que Fernandinho Beira-Mar forneceria ao governo a maconha que seria repassada aos usuários?

Todos, menos os ingênuos, sabem que, assim como não existe meia gravidez, também não há meia dependência. É raro encontrar um consumidor ocasional. Existe, sim, usuário iniciante, mas que, muito cedo, se transforma em dependente crônico. Afinal, a compulsão é a principal característica do adicto. Um cigarro da “inofensiva” maconha preconizada pelos araustos da liberação pode ser o passaporte para uma overdose de cocaína. Não estou falando de teorias, mas da realidade cotidiana e dramática de muitos dependentes. Transcrevo, caro leitor, o depoimento de um dependente químico. Ele fala com a experiência de quem esteve no fundo do poço.

“Sou filho único. Talvez porque meus pais não pudessem ter outros filhos me cercavam de mimos e realizavam todas as minhas vontades. Aos 12 anos comecei a fumar maconha, aos 17 comecei a cheirar cocaína. E perdi o controle. Fiz um tratamento psiquiátrico, fiquei 9 meses tomando medicamentos e voltei a fumar maconha. Nessa época já cursava medicina e convenci os meus pais de que a maconha fazia menos mal que o cigarro comum. Meus argumentos estavam alicerçados em literatura e publicações científicas. Eles mal sabiam que estavam sendo enganados, pois, além de cheirar, também passei a injetar cocaína e dolantina, que é um opiáceo. Sofri uma overdose e somente não morri porque estava dentro de um hospital, que é o meu local de trabalho. Após esta fatalidade decidi me internar em uma comunidade terapêutica e hoje, graças a Deus, estou sóbrio. O uso moderado de maconha sempre acabava nas drogas injetáveis. Somente a sobriedade total, inclusive do álcool, me devolveu a qualidade de vida que não pretendo trocar nem por uma simples cerveja ou uma dose de uísque.” A.S.N, médico, Ribeirão Preto (SP).

Para o respeitado especialista Ronaldo Laranjeira, professor de psiquiatria e coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas da Universidade Federal Paulista (Unifesp), “assistimos a uma grande negligência com o tratamento da dependência química (...) Não temos apoio governamental às mais de 2 mil comunidades terapêuticas que sobrevivem do voluntariado ou de parcos recursos de doações. Não temos apoio aos grupos de autoajuda. Não damos apoio aos milhares de famílias que sofrem no seu dia-a-dia, buscando algum tipo de tratamento para seus parentes.”

As drogas estão ceifando vidas jovens. A dependência química não admite ingenuidade. Reclama, sim, realismo e seriedade.


Rapaz drogado

 

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Carlos Alberto Di Franco, diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciência Sociais – IICS (www.iics.edu.br) e doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, é diretor da Di Franco – Consultoria em Estratégia de Mídia (www.consultoradifranco.com).

E-mail: difranco@iics.org.br

Publicado no Portal da Família em 31/01/2010

 

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