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Dr. André Gonçalves Fernandes

Coluna "Lanterna na Proa"

EUTANÁSIA E CULTURA DA MORTE

André Gonçalves Fernandes
Etimologicamente, eutanásia procede do grego (“eu” – bem, “thanatos” – morte) e significa morte sem sofrimento. Atualmente, é definida como uma operação voluntária para se propiciar uma morte por motivos de piedade: quer para se evitar sofrimentos fortes aos doentes, quer para se impedir um futuro doloroso a uma vida humana sem valor.

Numa visão panorâmica da história da humanidade, vários povos praticaram diversas formas de eutanásia. Platão, em “A República”, escreveu que “estabelecerás no Estado um disciplina e uma jurisprudência que se limite a cuidar dos cidadãos sãos de corpo e de alma, deixar-se-ão morrer aqueles que não sejam sãos de corpo”. Com exceções, como o juramento de Hipócrates (460 a.C.), base da deontologia médica, na Antiguidade, o respeito pela vida humana ainda engatinhava.

Com o advento do Cristianismo, renovou-se a mentalidade também neste aspecto, contudo, atualmente, vive-se um processo inverso. No segundo quarto do século XX, fundaram-se as primeiras organizações a favor da eutanásia. Por volta da década de 70, propagou-se a prática do “living will” (testamento biológico), uma declaração de última vontade, na qual o interessado manifestava que, no caso de padecimento de uma doença incurável e dolorosa, ele renunciaria a todos os meios terapêuticos extraordinários para o prolongamento de sua vida, em favor de uma “morte suave”.

Dentro de um processo de evolução das argumentações, muitas vezes defendidas por laureados pela Academia de Estocolmo, em prol do “homicídio por piedade”, não existe um marco objetivo e seguro que distancie a defesa deste tipo de morte da necessidade de eliminação de vidas “inúteis”, pois a premissa é igual: a negação do caráter sagrado de qualquer vida humana.

O nazismo foi um caso paradigmático das consequências da mentalidade eutanásica. Os programas de eutanásia não foram simples resultante da doutrina nazista, mas o ápice de um movimento intelectual iniciado nos anos vinte, com a publicação das obras do psiquiatra do Holocausto, Alfred Hoche, e do jurista do Holocausto, Karl Binding.

Ambos sustentavam a tese de que há seres humanos sem qualquer valor vital e preconizavam a eliminação pura e simples dos incuráveis, ressaltando os benefícios financeiros daí decorrentes, diante da carga econômica que tais pessoas representavam. Não admira que as atrocidades nazistas, maquinadas pelos pensadores do regime, tiveram seu pedestal teórico nas obras daqueles que especularam sobre a vida sem qualquer valor vital.

A primeira aplicação da aludida tese veio com a lei para a prevenção de doenças hereditárias (1933), a justificar a esterilização obrigatória para a prevenção da imbecilidade, da loucura, da surdez, da cegueira e do alcoolismo. Foi o começo do assassinato em massa dos pacientes psiquiátricos, já que era mais barato matá-los a manter as casas de recuperação e hospitais de tratamento.

Muitos médicos alemães daquela época foram influenciados por argumentos utilitaristas, que rejeitavam qualquer vetor ético que impusesse valores absolutos como o da vida humana. Aceitavam a doutrina sociológica de que o controle da vida é função indelegável da sociedade, a qual deve julgar e atuar com base em critérios estritamente materialistas, como a explosão demográfica e as necessidades sócio-econômicas de um povo.

Assim, tudo começou com o endosso da premissa da teoria eutanásica: existem vidas dignas de serem vividas e outras não. O que se referia, no início, aos doentes crônicos, ampliou-se para os socialmente improdutivos, os ideologicamente não alinhados, os indesejados racialmente e, ao cabo, atingiu todos os não alemães. Eis a lógica macabra da eutanásia.



Médico com seringa: eutanásia não

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ANDRE GONÇALVES FERNANDES, Post-Ph.D. Juiz de Direito e Professor-Pesquisador. Graduado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP). Mestre, Doutor e Pós-Doutorando em Filosofia e História da Educação pela UNICAMP. Juiz de direito, titular de entrância final em matéria cível e familiar, com ingresso na carreira aos 23 anos de idade. Pesquisador do grupo PAIDEIA-UNICAMP (linha: ética, política e educação). Professor-coordenador de metodologia jurídica do CEU Escola de Direito. Coordenador Acadêmico do Instituto de Formação e Educação (IFE). Juiz instrutor/formador da Escola Paulista da Magistratura (EPM). Colunista do Correio Popular de Campinas. Consultor da Comissão Especial de Ensino Jurídico da OAB. Coordenador Estadual (São Paulo - Interior) da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS). Membro do Comitê Científico do CCFT Working Group, da União dos Juristas Católicos de São Paulo (UJUCASP), da Comissão de Bioética da Arquidiocese de Campinas e da Academia Iberoamericana de Derecho de la Familia y de las Personas. Detentor de prêmios em concursos de monografias jurídicas e de crônicas literárias. Conferencista e autor de livros publicados no Brasil e no Exterior e de artigos científicos em revistas especializadas. Membro Honorário da Academia de Letras da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Titular da cadeira nº30 da Academia Campinense de Letras.

E-mail: agfernandes@tjsp.jus.br

Publicado no Portal da Família em 03/06/2010

 

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