Portal da Família
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Arte ou Desastre? |
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André Gonçalves Fernandes |
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Vivemos numa "cultura de repúdio". A frase, que não é minha, mas pertence a Roger Scruton dá bem o tom da forma como o Ocidente, cada vez mais e preocupantemente, esforça-se por repudiar seus valores estruturais, a começar pelos judaico-cristãos. Esse repúdio, ao fim, redundará num empobrecimento moral ou epistemológico, mas, antes, passará pelo empobrecimento estético, independentemente de qualquer influxo religioso. Sem um contato vital e profundo com a tradição e os textos sacros, ficaremos cegos, surdos e mudos para uma boa compreensão de dois milênios de arte e de civilização. Como já acontece com a arte contemporânea. Simbolicamente, nesse campo, o ponto da virada, rumo à essa cultura de repúdio, foi o pinico do Duchamp: a arte desceu do nível dos ciprestes do Van Gogh, passou pelo dito pinico e foi parar no esgoto da frivolidade e da bizarrice do cotidiano. Antes parasse por aí. Mas não. A imaginação humana realmente não tem mais limites estéticos e qualquer coisa vira um ato de expressão artística. Já comentei, certa vez, sobre a “profundidade estética” da exposição sobre orifícios anais que ocorreu em Paris há pouco tempo. Agora, talvez inspirado pelo “vanguardismo estético” da exposição parisiense, um universitário inglês promete perder a “virgindade anal” no meio de uma “performance artística”, cujo título do projeto é Art School stole my virginity (a Escola de Arte roubou minha virgindade). Resumo da ópera: o sujeito, todo nu, assim como seu companheiro, vão se lambuzar de tinta colorida sobre uma tela em branco esticada no chão de uma galeria de arte, manter uma relação homossexual e o resultado dessa pornopopeia será exposta depois para o delírio e para os aplausos daqueles que reduzem a arte ao nível pedestre da cupidez, da vontade de poder e da prepotência sobre o outro. Não vou entrar no argumento de fundo dessa manifestação provocativa: a destruição simbólica da virgindade da moral judaico-cristã. Apenas lamento informar ao jovem universitário que ele chegou com uns cinquenta anos de atraso para avocar qualquer tipo de ineditismo no assunto e que ele está sendo manipulado pela “agenda da cultura de gênero” no trabalho de “desconstrução da heteronormatividade”. O fato que interessa aqui é a tal “loucura da arte” (Henry James), que pode ser resumida no clichê expressão/repressão, o qual domina grande parte das discussões analfabetas do nosso tempo. Como somos “herdeiros de uma sensibilidade romântica superada”, acredita-se, hoje, que a arte deve ser "autêntica" e que a "autenticidade" consiste em abrir as portas da alma (na prática, são dos porões), sair por aí oferecendo nossos "sentimentos" e "emoções" numa bandeja de prata e, por via dessa “catarse”, libertarmo-nos de nossas neuroses mais profundas. Bem, isso está mais para terapia do que arte. Aliás, boa parte da arte moderna não passa de um amontoado de pinturas, esculturas e obras que refletem e concretizam uma espécie de “sessão artística de psicanálise”. Eliot já disse que a arte não é uma questão de expressão ou repressão, mas de disciplina e sublimação. A destruição da arte e a pouca relevância que ela tem dado na retratação da beleza é um claro sintoma de um problema que supera o estético e que envolve uma crise de existência humana. Se a beleza salvará o mundo, como já alertou o papa João Paulo II, tenho pouca esperança neste século que se inicia. A beleza da arte não se confunde com a tela “colorida” e “viscosa” de nosso jovem “artista” inglês: uma superfície ”sexualmente” pigmentada pelas mais variadas cores e por muito sêmen masculino. Não admira que ele seja como os jovens anoréxicos que se olham no espelho e desatam a começar outra dieta em nome de umas calorias excedentes que não têm mais. Todos eles acreditam genuinamente na sua própria genuinidade. Com respeito à divergência, é o que penso. |
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ANDRE GONÇALVES FERNANDES, Post-Ph.D. Juiz de Direito e Professor-Pesquisador. Graduado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP). Mestre, Doutor e Pós-Doutorando em Filosofia e História da Educação pela UNICAMP. Juiz de direito, titular de entrância final em matéria cível e familiar, com ingresso na carreira aos 23 anos de idade. Pesquisador do grupo PAIDEIA-UNICAMP (linha: ética, política e educação). Professor-coordenador de metodologia jurídica do CEU Escola de Direito. Coordenador Acadêmico do Instituto de Formação e Educação (IFE). Juiz instrutor/formador da Escola Paulista da Magistratura (EPM). Colunista do Correio Popular de Campinas. Consultor da Comissão Especial de Ensino Jurídico da OAB. Coordenador Estadual (São Paulo - Interior) da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS). Membro do Comitê Científico do CCFT Working Group, da União dos Juristas Católicos de São Paulo (UJUCASP), da Comissão de Bioética da Arquidiocese de Campinas e da Academia Iberoamericana de Derecho de la Familia y de las Personas. Detentor de prêmios em concursos de monografias jurídicas e de crônicas literárias. Conferencista e autor de livros publicados no Brasil e no Exterior e de artigos científicos em revistas especializadas. Membro Honorário da Academia de Letras da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Titular da cadeira nº30 da Academia Campinense de Letras. E-mail: agfernandes@tjsp.jus.br Publicado no Portal da Família em 04/10/2014 Outros artigos do autor: |
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