Pode-se atribuir a culpa da maioria dos casamentos infelizes ao velho
adágio: "O amor é cego".
Há exceções, sem dúvida, como por exemplo se o marido ou a mulher contraem
uma doença mental que provoque uma mudança radical de personalidade, impossível
de prever. Mas, fora esses casos excepcionais, a personalidade básica
de uma pessoa já está firmemente fixada quando ele ou ela atingem a idade
conveniente para casar-se. E num noivado de duração razoável, essa personalidade
básica pode ser apreciada por cada um dos futuros cônjuges, desde que
ele ou ela tenham os olhos bem abertos.
Infelizmente, o amor, ou melhor, a atração física, é um grande olho fechado
e um grande teorizante. "Eu sei que ele bebe um pouco (na verdade,
o noivo passa a metade da vida bêbado), mas tudo se deve à sua timidez;
quando nos casarmos, isso passará". "Reconheço que ela é um
tanto mandona, mas é uma garotinha tão doce que nem se repara nisso; e
de qualquer maneira, quando nos casarmos, serei eu quem terá a última
palavra". "Às vezes, zanga-se por qualquer coisinha, e parece
que estamos sempre discutindo: mas, coitado, é que ele está nervoso e
tenso. O casamento o fará mudar". "Meu Deus, que mulher tão
ciumenta! Mal posso beijar a minha própria irmã! Mas aposto que se comporta
assim porque tem medo de perder-me. Quando nos casarmos, mudará de maneira
de ser".
Todos nós temos ouvido exclamações deste gênero. Isso acontece às vezes
porque o desejo físico fez adormecer a razão. Também pode acontecer porque
se está tão ansioso por casar que ele ou ela só têm olhos para o lado
bom da pessoa que escolheram para consorte. Há, além disso, casos patológicos:
o filho dominado pela mãe que busca inconscientemente uma esposa que o
domine; a jovem que, por um inconsciente sentimento de culpa, se sente
inclinada a escolher um marido brutal que inflija os castigos que deseja
sem saber.
O pecado original perturbou o domínio que a razão deveria exercer sobre
o impulso biológico, e por isso talvez não seja tão surpreendente que
muitos jovens, de um e de outro sexo, caminhem cegamente para um casamento
fadado à infelicidade. E caminham nessa direção apesar dos sinais de perigo
que foram colocados para que pudesse ver qualquer pessoa inteligente.
Os maridos alcoólatras, as esposas briguentas, os homens de temperamento
vicioso e as mulheres de ciúmes enfermiços não desenvolveram repentinamente
as suas tendências indesejáveis após o casamento. E só um ingênuo acreditará
piamente no velho argumento de que "posso fazê-lo - ou fazê-la -
mudar", mesmo contra toda a evidência psicológica: a evidência de
que o padrão da personalidade básica de uma pessoa não pode ser alterado
após a maturidade. Uma pessoa pode tornar-se virtuosa com o passar dos
anos, mas normalmente agravar-se-ão as desordens emocionais e psicológicas
que estejam profundamente enraizadas nela.
Seria necessário um milagre para que acontecesse o contrário. E milagres
deste gênero não se dão com frequência.
Felizmente, os que vêem no casamento uma vocação - e, graças a Deus, são
legião - conservam certos vestígios de critério e sabem levar a cabo uma
escolha sábia e exemplar. Não se limitam a perguntar: "Será que nós
dois nos daremos bem?. Também formulam esta outra pergunta: "Será
um bom pai - ou uma boa mãe - para os nossos filhos?".
Contudo, mesmo entre a grande multidão dos casais normalmente felizes,
produzem-se momentos de tensão que resultam da falsa idéia de que o outro
cônjuge pode mudar a sua personalidade a uma simples ordem da nossa parte.
Um ingrediente importante na felicidade conjugal é a boa vontade necessária
para marido e mulher se aceitarem um ao outro "tal como são".
O casal perfeito é um fenômeno raro. Serão quase inevitáveis as diferenças
de personalidade e os antagonismos temperamentais. O importante é acomodar-se
a essas diferenças, em vez de esperar que desapareçam.
Se a esposa é por natureza uma má administradora, não haverá violência
alguma que a converta numa financista atilada ou numa eficiente dona-de-casa.
A vida matrimonial será mais feliz se o marido a aceitar e amar tal como
é, ao mesmo tempo em que procura compensar-lhe as deficiências - tal como
ela certamente estará fazendo com ele. Se o marido é por natureza um homem
de hábitos caseiros, as contínuas lamúrias da esposa não conseguirão convertê-lo
num indivíduo que gosta de sair, fã dos divertimentos e das festas de
sociedade. Uma esposa ativa poderá considerar isso como uma provação,
mas descobrirá um casamento muito mais feliz se aceitar alegremente a
realidade e parar nas suas tentativas de modificar o marido. A esposa
pode ser exageradamente ordenada, daquelas que se aborrecem com um alfinete
fora do lugar, e o marido será desses desmazelados que nunca põem nada
de volta no seu lugar. O marido pode ser dessas pessoas obcecadas com
a pontualidade, e a mulher uma aturdida que jamais tem o almoço pronto
a horas.
"Tu tens as tuas faltas, e eu as minhas. Aceitemo-nos tal como somos.
Reparemos unicamente no que há de bom em nós para que, sob o olhar de
Deus, o nosso casamento e o nosso lar conheçam a verdadeira felicidade".
Com esta filosofia simples, mas infalível, pode-se edificar dia-a-dia
a felicidade conjugal. Benditos os filhos que cheguem a um lar onde tenham
assento a paz e a caridade.
Extraído
do livro: Não
vos preocupeis, de Leo Trese
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Pode-se
atribuir a culpa da maioria dos casamentos infelizes ao velho adágio:
"O amor é cego".
Infelizmente, o amor, ou melhor, a atração física, é um grande olho fechado
e um grande teorizante. "Eu sei que ele bebe um pouco (na verdade,
o noivo passa a metade da vida bêbado), mas tudo se deve à sua timidez;
quando nos casarmos, isso passará" . Será ?
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