Tertúlia para Crianças *

A tertúlia já é um direito de meus filhos. Eles a exigem. Quando chego em casa antes do jantar deles, sempre há algum que diz, logo ao ver-me: "Papai chegou; hoje teremos tertúlia !"

Ricardo, o mais velho, tinha apenas 7 anos quando eu e meus filhos costumávamos dar alguns passeios pelo campo. Falava-lhes dos temas mais variados: corpos naturais, corpos artificiais, números, cifras, nomes de animais, de plantas, de minerais...

Depois surgiam as perguntas. Os dois mais velhos respondiam rapidamente e bem. A terceira, Aninha, necessitava que lhe soprassem:

- Diga-me o nome de um mineral.

Olhou para mim pedindo ajuda; inclinei-me e lhe disse ao ouvido:

- Carvão.

Ela repetiu em voz alta, muito séria:

- "Carvão !"

A seguir mudamos de tema; uma nova explicação e novas perguntas:
- Ricardo, nome de um animal...

- Cavalo.

- Você, Carminha.

- Ovelha.

Olhei para Aninha. Sem esperar ajuda, disse-me muito séria:
- "Carvão !"

Os mais velhos divertiram-se muito. Todos rimos. Naquela tarde responderia sempre o mesmo: - Carvão. Depois, até ela riria de si mesma.

Às vezes, recitava-lhes uma das poucas poesias de meu repertório. A seguir repetiam, um de cada vez, cada verso. Quando era a vez dos pequenos, seus enganos provocavam o riso dos demais.

Um dia, disse-lhes:
- Quando chegarmos em casa vamos fazer uma tertúlia.

- O que é isso ?

- Vocês entenderão melhor quando a fizermos.

Naquele dia, sentamo-nos todos no terraço, enquanto a mamãe preparava o jantar. Falei em primeiro lugar:
- Vou lhes explicar de onde vem o pão que comemos todos os dias.

- Cultivo, semeadura, germinação, limpeza, chuva, calor, colheita, moinho, padaria...

As crianças olhavam-me sem pestanejar. De vez em quando, faziam perguntas. No final, comprometiam-se a falar na tertúlia seguinte, sobre aquilo que havia explicado.

E pouco a pouco, aquelas reuniões antes do jantar iam se tornando muito naturais, sobretudo nos fins-de-semana e feriados.

Naturalmente, nessas tertúlias, quase tudo corre por minha conta, mas tenho uns auxiliares extraordinários nos livros de contos e nas enciclopédias. Também costumo comentar-lhes algum acontecimento da semana, de especial interesse para as crianças. Nunca falta, ao final, alguma canção ou poesia.

- Papai, que dia é amanhã ?
- Sexta-feira.

Paulinho, o caçula, não conhece bem o calendário:
- E o seguinte ?
- Sábado.
- Oba ! Tertúlia !

Depois de uma pequena discussão para ocupar o lugar que cada um considera melhor, parecem umas crianças formidáveis.

- Hoje vamos falar da pesca de sardinha.

Entre coisas sérias e piadas - os pequenos dão uma nota divertida com suas explicações - esclarecemos em que consiste uma sardinha. Termino a minha explicação.

- Que tal, você gostou ?

João, que não havia entendido muita coisa, disse que sim. E continuou com seus carros ..."brr-brr...". Tudo se reduz a motores para esse garoto, "motorista" da família, que passa o dia empurrando todas as cadeiras da casa.

- E o verso que você tem de decorar esta semana :
- Sei um pedaço. Quer ver ?

"Minha terra tem palmeiras,
onde canta o sabiá
As aves que aqui gorgeiam
Não gorgeiam como lá".

Os versos continuam por um bom tempo.
- Explicaram a vocês o evangelho de hoje ?
- Lemos no colégio e nos explicaram, mas vamos falar mais sobre isso.

Depois alguém propõe que se jogue damas. Outros dizem que não e preferem cantar. Enquanto cantávamos, mamãe nos avisa:

- O jantar está na mesa.

Criar momentos de convivência familiar. Sorrir, contar coisas alegres, mesmo que custem. Dessa forma se aprende "em casa" o significado da amizade, da ajuda mútua, da confiança, da participação. Lembranças de infância que ficaram para sempre na memória.

Fonte: Programa de Orientação Familiar - Básico
ADEF - Associação de Desenvolvimento da Família

* Tertúlia: a prosa, o bate-papo em família.

"Reunião familiar, agrupamento de amigos, assembléia literária."
Novo Dicionário Aurélio